Por um momento inteiro deixei seu corpo encontrar meu silêncio. Talvez fosse mera inquietude, ou mera insensatez. O fato que não sabíamos é que eles não se perderiam. Jamais. Do meu silêncio fez-se o riso. Do riso, o risco do nosso sobre-amor.
Aos poucos ouvia sua voz clamando por mim, os sussurros caminhando na minha direção. Meu abandono abandonado e seu amor, sem pedir qualquer licença, veio ocupando e invadindo todo o espaço.
Perdido o juízo, caladas as palavras, a descrição vinha apenas para mostrar que nada estaria por um triz, durante o tempo que dura sempre.
Um afeto descarado. Assim sou eu por inteira, desde a lembrança à presença, desde seu sorriso infantil estampado à sua intensidade. Assim sonhei você comigo, assim você se entregou a mim.
Um olhar sempre feito para seus olhos. Inúmeros espelhos que refletem o carinho seu e o cuidado meu: dois zelosos amores.
As mãos com o calor que tanto gosta tem o sentido exato para sua delicadeza e para sua posse. Só você as tem como preferir para fazer o que quiser delas. Todo movimento só acontece pelos seus.
Os afagos que se completam, os suspiros declarados, os arrepios que se provocam, a mistura de perfumes e o encontro de sensações. Só faz-se saber que eu sou só de você. E você, só de mim.
Meu, tudo.
"É só teu o meu livro; guarda-o bem;
Nele floresce o nosso casto amor
Nascido nesse dia em que o destino
Uniu o teu olhar à minha dor"
Florbela Espanca